Historial – Banda Recreio Camponês

A Banda Recreio Camponês, comummente apelidada “Banda Nova”, foi fundada a 1 de Dezembro de 1910, em Câmara de Lobos, por iniciativa do jovem merceeiro José Gonçalves de Freitas, em consequência de alguns desentendimentos que grassavam na Banda Recreio dos Lavradores (Banda Municipal de Câmara de Lobos), onde havia iniciado a sua actividade como músico, no instrumento requinta. Inicialmente constituída por dez a doze executantes, a colectividade – que contava entre os seus protectores o Padre Gouveia e Freitas – ensaiava numa dependência da casa de Francisco Gonçalves de Freitas, pai do fundador, localizada ao sítio do Caminho Grande e Ribeiro de Alforra (conhecido popularmente como Escalracho). Um mês depois, a 1 de Janeiro de 1911, a filarmónica realizou a sua primeira actuação pública, na festa em honra do Senhor Jesus, no Estreito de Câmara de Lobos. No ano seguinte, a “música nova” apresentava-se em São Gonçalo, em agradecimento ao Padre Gouveia de Freitas, antigo Vigário em Câmara de Lobos, pela protecção com que havia beneficiado a colectividade. A 30 de Novembro de 1913, o fundador e primeiro regente da Banda Recreio Camponês faleceu precocemente aos 29 anos, merecendo o reconhecimento e a estima dos seus mais de vinte executantes e dos muitos simpatizantes da instituição. No restante da década, a “música nova” apresentou-se regularmente nas festividades de Câmara de Lobos e Estreito de Câmara de Lobos e nas das paróquias próximas do Curral das Freiras e Vitória, sob a direcção de Guilherme Honorato Lino (1913-1915), Luís Inácio Gonçalves (1915) e Artur Maria Lopes (1915-1919).

Em finais de 1919, João Ornelas de Abreu (Júnior) tomou os destinos da Banda Recreio Camponês, servindo, por mais de cinquenta anos, como regente, professor de aprendizes e assumindo cargos nos corpos regentes da instituição. Sob a sua hábil regência, os executantes da Banda Recreio Camponês, que até então haviam sobretudo animado as celebrações religiosas do concelho, apresentaram-se, nos seguintes cinquenta anos, nas festividades religiosas realizadas no Canhas, Ponta Delgada, Boaventura e nas de Santa Cruz, Caniço, Camacha; nas paróquias de Santana, Alegria, São Martinho, São João da Ribeira, Ajuda, Monte, Santo António, São Roque, São Gonçalo e Bom Sucesso no Funchal; e desde pelo menos meados do século, também nos arraiais de Porto Moniz, Arco da Calheta, Tabua, Paul do Mar, Campanário, Ribeira Brava e Serra de Água.

A Banda Recreio Camponês oferecia ainda a sua graciosa cooperação aquando de cerimónias oficiais e recreativas. A par da habitual comemoração das efemérides da história política nacional e dos dias santificados, a filarmónica câmara-lobense tomou parte, em 1955, na recepção ao Presidente da República Marechal Craveiro Lopes. Naquele período, a Banda Recreio Camponês coadjuvou outras iniciativas culturais, apresentando-se na recepção à Tuna Académica de Coimbra, em 1925; no “Arraial Minhoto”, realizado no Casino Vitória, em 1930; na Festa dos Miúdos, que decorreu no Jardim Municipal (Funchal) em 1935; no Presépio de Belém e Exposição Agrícola Pecuária e de Artes e Indústrias Regionais, organizado na sede da Banda Municipal do Funchal, em 1943; na Grande Feira Popular do [C.S.] Marítimo, no Campo Almirante Reis, em 1959. Desde finais da década de 1950 a meados da década seguinte, a Banda Recreio Camponês oferecia, nos meses de Abril, algum recreio e instrução musical às comunidades locais, apresentando-se em concerto no Coreto Municipal da Vila de Câmara de Lobos.

Alguns outros episódios da história artística da colectividade merecem particular destaque: em 1927, a colectividade ocupava nova sede social, na casa de José dos Santos, ao Lagar das Giestas ao sítio da Quinta do Leme, transitando, em 1936, nove anos volvidos, e por ocasião da celebração dos seus vinte e cinco anos de actividade, para a corrente sede social, no mesmo sítio da Quinta da Leme, ao Lugar da Bela Vista. Em inícios daquela década, a instituição artística recusara o título de Banda Paroquial de Câmara de Lobos atribuído em deliberação camarária de 21 de Março de 1930, e no ano imediato, aprovava e publicava os seus primeiros estatutos. Naquele auspicioso início de década, a Banda Recreio Camponês beneficiara ainda do auxílio do consagrado regente João Júlio da Costa Cardoso – que na imprensa surge nomeado como seu director artístico –, que se deslocara a Lisboa para adquirir novos instrumentos para a colectividade.

Em 1972, João Ornelas de Abreu confiou a direcção artística da Banda Recreio Camponês a João Figueira Quintal. No último quartel do século XX, os órgãos directivos e artísticos da colectividade empenharam-se para dotar a colectividade das necessárias condições ao seu florescimento. Naquele período, novos estatutos foram redigidos e aprovados, e a 24 de Novembro de 1976, os seus directores celebraram escritura lavrada no Cartório Notarial de Câmara de Lobos, conferindo identidade jurídica à colectividade, que tomou a denominação Banda Recreio Camponês – Associação Cultural e Recreativa do Concelho de Câmara de Lobos. Iniciaram-se em 1984 os esforços para a aquisição da sede social, sendo celebrado protocolo, em 29 de Novembro de 1988, entre o Governo Regional da Madeira e a Banda Recreio Camponês para esse desiderato. Desde 1991, sujeitava-se a colectividade à amortização da dívida de aquisição do edifício em oito prestações anuais, quando em 1997 deliberou o Governo em favor da remissão daquele débito. A Banda Recreio Camponês honrou ainda o seu septagésimo-quinto aniversário com a publicação de um opúsculo dedicado à história da colectividade, da autoria do Major Tito Abílio da Silva.

Sob a direcção artística de João Figueira Quintal – e de João Gomes Henriques de Sousa, que temporariamente assumiu a regência da colectividade entre 1980 e 1981 –, a Banda Recreio Camponês persistiu nos seus esforços pela formação e prática musical dos câmara-lobenses – e em particular, de mulheres, cuja admissão se permitiu desde 1974. A colectividade apresentava-se em festividades religiosas em várias paróquias da Ilha, em comemorações cívicas e eventos culturais. A Banda Recreio Camponês tomou parte nas actividades artísticas organizadas pelo INATEL a propósito das comemorações do 1º de Maio, em 1976; em 1982, obteve o primeiro prémio no Concurso de Bandas da Região Autónoma da Madeira, organizado no Funchal, e em 1984, obteve igual classificação no Festival de Bandas realizado na Ribeira Brava. Representou o movimento filarmónico regional e o arquipélago em digressões ao Continente e aos Açores, tomando parte no II Encontro de Bandas de Portalegre, em 1989 e, em 1997, no V Festival de Bandas de Fenais da Luz (Açores), a convite do Centro Social e Cultural local. Em Lisboa, assinalou, com várias outras bandas filarmónicas regionais, o Dia da Madeira na Expo’98.

Em 1998, Nélio de Freitas Silva foi nomeado sub-chefe da Banda Recreio Camponês, e, aquando da comemoração do nonagésimo aniversário, foi-lhe atribuída a direcção artística da instituição. A par da habitual actividade artística em festas religiosas, comemorações cívicas e concertos, a Banda Recreio Camponês realizou dois intercâmbios, deslocando-se em 2007, aos Açores, e em 2016, a Espanha, acolhendo na Madeira, pelas mesmas datas, a Banda Lira Nossa Senhora da Estrela e a Banda Filarmónica de Olivenza. Ainda recentemente, a filarmónica câmara-lobense tomou parte em dois concertos beneméritos em benefício da delegação regional da Associação Portuguesa para as Perturbações do Desenvolvimento e Autismo.

A Banda Recreio Camponês legou-nos, nas últimas décadas, vários registos fonográficos e bibliográficos da sua longeva actividade artística: em 2006, gravou para a colectânea As Melhores Bandas Filarmónicas da Região e, em Novembro de 2008, lançou o seu primeiro CD, intitulado Banda Recreio Camponês, um registo que documenta várias das obras interpretadas pela colectividade desde a sua fundação. Em 2010, por ocasião do centenário, a Banda Recreio Camponês editou um DVD do concerto comemorativo e publicou um segundo estudo histórico, A memória de 100 anos em concerto intemporal, da autoria de António Castro Silva e Silvina Serrão. Por fim, em 2013, a Banda Recreio Camponês colaborou ainda na edição do CD-ROM da Colecção Madeira Música devotada às bandas filarmónicas do arquipélago, publicado pela Direcção de Serviços de Educação Artística e Multimédia em cooperação com a Associação de Bandas Filarmónicas da Região Autónoma da Madeira. Por fim, num gesto zeloso e diligente, corpos directivos e artísticos e seus associados procederam à doação dos fundos patrimoniais da Banda Recreio Camponês ao Arquivo e Biblioteca da Madeira, a 26 de Junho de 2020, garantindo a preservação e a consulta pública, para fins académicos, de um valioso repositório musical.

Pelo contínuo empenho na instrução artística das comunidades locais e pelo seu fomento ao recreio dos seus associados e demais população, foram conferidas à Banda Recreio Camponês as seguintes condecorações: a 21 de Junho de 1979, foi-lhe atribuído estatuto de Colectividade de Utilidade Pública, pelo Governo Regional da Região Autónoma da Madeira; em 1988, foi-lhe consignada distinção pela Secretaria Regional do Turismo e Cultura; a 16 de Outubro de 2011, a Câmara Municipal de Câmara de Lobos consagrou-lhe Louvor público, em reconhecimento do seu labor cultural em cem anos de existência; a 4 de Outubro de 2018, foi-lhe atribuída a Medalha de Honra do Município, pela auspiciosa formação musical de centenas de câmara-lobenses.

A esse respeito, Cláudio Vieira, Presidente da Direcção, e Nélio Silva, director artístico, congregaram esforços para a reestruturação da Escola de Música da instituição, obtendo a cooperação de vários executantes qualificados com formação superior para o ensino musical de teoria musical e de instrumentos de sopro e percussão. Correntemente, a Banda Recreio Camponês é constituída por cinquenta e cinco elementos, e cerca de trinta aprendizes, reunindo um assinalável número de jovens instrumentistas que assegurarão a auspiciosa continuidade da centenária colectividade câmara-lobense.

Rui Magno Pinto

Bibliografia

Manuel Pedro Freitas, Câmara de Lobos, Dicionário Corográfico, Câmara de Lobos, sua gente, história e cultura, edição electrónica www.concelhodecamaradelobos.com/dicionario/banda_recreio_campones.html

Vítor Sardinha & Rui Camacho, Rostos e Traços das Bandas Filarmónicas Madeirenses, DRAC, 2001.

Site Oficial da Banda Recreio Camponês: www.bandarecreiocampones.com.

Tito A. Silva, 75 anos da Banda Recreio Camponês de Câmara de Lobos, 1985.

“Notícias Religiosas”, Diário de Notícias, 2203.1914.

“Notícias Religiosas”, Diário de Notícias, 29.05.1914.

“Banda Recreio Camponez”, Diário de Notícias, 13.02.1927.

“Banda Recreio Camponês participou no II Encontro de Bandas de Portalegre”, Diário de Notícias, 09.07.1989.

“Filarmónica ‘Recreio Camponês’”, Jornal da Madeira, 6.12.1924.

“Banda Recreio Camponês assinou protocolo com o Governo para adquirir a sua sede”, Jornal da Madeira, 30.11.1989.

“Viagem aos Açores ultrapassou expectativas”, Jornal da Madeira, 20.07.1997.

Revista Girão nº 3, 2º Semestre, 1989, pág. 93.

http://www.bandasfilarmonicas.com/cpt_bandas/banda-recreio-campones/

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